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A CASA DO APRENDIZ

"MARABÔ" Centro de Cultura, Documentação, Pesquisa e Estudos das Ciências Esotéricas.

"MARABÔ" Centro de Cultura, Documentação, Pesquisa e Estudos das Ciências Esotéricas, mantém encontros periódicos para o treinamento, exercícios, troca de experiências, comemoração dos Sabbáths e Esbbáths, além de trabalhar juntos em outros rituais. A disciplina é essencial na formação de uma consciência mágica comum ao grupo e de uma Egrégora (que é, para simplificar, a força mágica do grupo e sua repercussão no Astral). "MARABÔ" Centro de Cultura, Documentação, Pesquisa e Estudos das Ciências Esotéricas tem seu próprio símbolo e nome, suas regras, suas características, seu método de estudo e "carisma mágico próprio". "MARABÔ" Centro de Cultura, Documentação, Pesquisa e Estudos das Ciências Esotéricas pode e deve trocar influências, porém sempre respeitando a individualidade de cada membro. Mais que tudo,"MARABÔ" Centro de Cultura, Documentação, Pesquisa e Estudos das Ciências Esotéricas é um organismo vivo, pulsante, que responde segundo seus membros. Se alguém está doente, mal-intencionado, desequilibrado, angustiado, isso tudo se reflete no desempenho do grupo, nos resultados dos rituais. Por outro lado se há alguém extremamente bem, feliz, disposto, energizado, isso também é dividido com os membros que sentem a energia desta Comunhão com "O ABSOLUTO". "MARABÔ" é o Local para o Culto a Sabedoria, ao Conhecimento, das Diversas Culturas Étnicas e Correntes Filosóficas, a Teosofia, a kaabalah, entre outras, Ciências Esotércas. "MARABÔ" dá início à caminhada espiritual. Indica sempre que algo novo está a começar. Tem uma mesa à sua frente, onde se podem ver quatro objetos simbólicos: uma taça, um punhal, um pergaminho e uma moeda, que pode ter a imagem do pentagrama. Parece que precisa de ajuda superior para tomar uma decisão e por isso ergue um pequeno bastão para o alto, captando energia e dirigindo-a para baixo, com a outra mão. É como se ele fosse o elo entre as energias divinas e o mundo material, mas precisa de ajuda porque ainda é um aprendiz. O punhal é o simbolo da luta, da energia sexual, do poder e da vitória. A moeda é o simbolo do mundo material, dos bens e do dinheiro. O pergaminho é a inteligência, o estudo, a espiritualidade. A taça, por sua vez, simboliza as emoções, o amor, o coração, a sensibilidade. O bastão é o simbolo da vontade e da sabedoria. Na caminhada espiritual, o "MARABÔ" representa o ponto de partida e a necessidade de fazer uma canalização de vibrações superiores para poder realizar uma evolução. "MARABÔ" representa o poder da mente em direcionar um projeto com maestria, concentrando esforços e inteligência para um determinado fim. Representa também a concentração sem esforço, pois trabalha e cria com naturalidade e espontaneidade. Pode representar ainda como uma necessidade de tomar uma iniciativa imediatamente, de ousar mais. Realização, perseverança, conquista. "MARABÔ" gosta de planejar, colocar em prática seus mais audaciosas planos, depois os controla e comanda pessoas para as suas conquistas materiais. Com "MARABÔ", temos a certeza de possuir condições para concretizarmos tudo o que queremos, pois temos as condições materiais, estruturais e financeira para a concretização. Além do mais, este período será de segurança e estabilidade com isso nos proporcionando uma satisfação interior muito grande. "MARABÔ" é o Avanço, progresso, início de algo novo. "MARABÔ" simboliza a vitória, direção, controle, esforço, confiança, o caminho. Com o "MARABÔ" há progresso, há projetos em andamento. Simboliza a ação, que se toma a seguir a uma decisão. Aquilo que foi resolvido está a ser executado, é a realização de projetos. A pessoa deve ter força e liderança suficientes para evitar que um anule o outro. Deve ter controle firme para manter o equilíbrio. Na caminhada espiritual,o"MARABÔ" representa o momento em que o viajante passou pela encruzilhada, tomou um rumo firme e está determinado a cumprir mais etapas evolutivas. Olha para o horizonte, sem qualquer expressão. Não há sensualidade, nem agressividade. Parece calma, equilibrado, limpa, ordenada. "MARABÔ" é o equilíbrio, processos judiciais (julgamento), leis, limites. Ele traz o equilíbrio, a isenção, a análise do passado. "MARABÔ" cumpre um papel, representa uma instituição. Também simboliza a colheita - "Cada um colhe aquilo que plantou". "MARABÔ" simboliza o plano material e o plano emocional, ou seja, os dois devem estar equilibrados, Ele representa a punição que pode distribuir a quem a merece. Na caminhada espiritual, "MARABÔ" representa um momento de equilíbrio, no qual se recebem as recompensas (ou punições) materiais e emocionais pelo caminho já percorrido. É inevitável, o Refletir sempre antes de tomar decisões, pois devem ser justas. Muitas vezes ele também simboliza o isolamento, restrição, afastamento. Algumas vezes "MARABÔ" isola-se para descobrir o conhecimento que o rodeia, na natureza, por exemplo, e também para se autoconhecer. O aspecto fundamental é que necessita de cortar os laços (temporariamente ou não) com a sociedade que o rodeia. "MARABÔ" é Fiel a si mesmo e sabedoria, representa o conhecimento da ciência oculta. Ele sé a prudência, que o acompanha em sua busca de orientar melhor, mostrando a luz da inteligência e da sabedoria, (a luz da verdade). Significa também que a luz atinge o passado, o presente e o futuro. E Nele existe austeridade. Ele segue sua viagem através do tempo com a sabedoria. "MARABÔ" se refere à acumulação de conhecimentos e está disposto a ouvir e ajudar os que o procuram. Representa o valor do conhecimento adquirido à custa de trabalho ininterrupto, que apenas mentes privilegiadas conseguem desenvolver."MARABÔ" está relacionado ao elemento terra, portanto à vida material, às conquistas financeiras, profissionais e a tudo que, enfim, representa aquilo que pode ser tangível em termos materiais, para ele a possibilidade de se conseguir conquistar a segurança material com trabalho, disciplina e esforço. O ser humano é ambicioso e a ambição tem relação como o naipe de ouros. "MARABÔ" é representa a dedicação, o esforço, o empenho dedicados aos estudos e ao trabalho; ligado ao elemento ar e está relacionado ao poder ambivalente da mente e do pensamento; ligado ao elemento água e ao mundo dos sentimentos, sendo o símbolo da taça relacionado ao coração, como receptáculo das nossas emoções. Ele corresponde ao elemento fogo que a tudo transforma sem ser alterado. Está ligado ao fazer e à criatividade.

DANÇA DO VENTRE

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terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Categorias peirceanas e o mundo sígnico dos deuses iorubás

Categorias peirceanas e o mundo sígnico dos deuses iorubás:
por uma semiose dos orixás
Alexandre de Oliveira Fernandes
*
Resumo: Apresenta as categorias semióticas de Charles Sanders Peirce, ícone, índice e
símbolo, como ferramenta de análise dos signos presentes nos mitos dos deuses iorubás.
O presente trabalho pretende aproximar academia e terreiro, estudando a ação dos
signos, a semiose no culto aos orixás, com vistas a responder como a mitologia dos
orixás e os ritos do candomblé se unem para formar o ethos deste grupo religioso?
Como os símbolos veiculados expressam determinados “comandos”? Como “sentem”
os adeptos do mundo dos orixás o que “sentem”?
Palavras-chave: Semiótica; Mitologia iorubá; Orixá
1. Da academia para o culto aos orixás: notas para
uma aproximação
Algumas áreas do conhecimento já se “apropriaram” do
instrumental da semiótica para responder às suas
questões. Assim, há pesquisas que unem a Semiótica à
Engenharia de Produção, à Interface Gráfica, à
Educação e à Literatura (SILVESTRE: 2003;
HOELZEL: 2004; BARON: 2003; ARALDI: 2004,
SIMÕES: 1999). Contudo, apesar de passados mais de
cem anos da formulação das idéias de Charles Sanders
Peirce (1972), a Semiótica ainda é uma ciência
significativamente pouco estudada nos meios
acadêmicos, refém de um hermético círculo de filósofos
espalhados pelo mundo (QUEIROZ, 2004).
Quando aproximamos esta discussão dos estudos sobre religiões de matrizes africanas é
inegável que também há um longo caminho a trilhar. Coletamos em Munanga (2002)
apenas uma pesquisa que relaciona Semiótica e orixás. Trata-se de Dissertação de
mestrado apresentada à Universidade de São Paulo em 1999 por André Bueno,
intitulada Bumba Meu Boi maranhense em São Paulo: dimensões semióticas.
Neste contexto, defendemos estudos que aproximem a Semiótica e o mundo dos orixás,
propondo uma leitura dos mitos dos orixás e dos ritos do candomblé, tomando a Teoria
Geral do Signo como “uma ciência hipotético-dedutiva", que nos permite apontar
rigorosamente, “embora de modo eminentemente falível”, como se expressam os signos
presentes nesta semiose (PAVAN, 2001, p.12).
* Professor de Língua Portuguesa e Literatura do Instituto Federal de Educação Tecnológica da Bahia -
IFBA/Eunápolis. Mestrando em Letras: Linguagens e Representações pela Universidade Estadual de
Santa Cruz / UESC.
Charles Sanders Peirce
(1839-1914)
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2. Signo, semiótica e semiose no culto aos orixás
A noção de signo em Peirce é tão ampla que “qualquer ato passado ou qualquer
qualidade de sentimento podem assumir o papel de signo, independentes de um sujeito
psicológico ou de um organismo biológico que os abrigue ou interprete” (PIRES, 2002,
p.36). Isto nos permite inferir que o universo está repleto de signos e isso não depende
de que os percebamos, de que com eles tenhamos qualquer contato: eles simplesmente
existem além do sujeito.
Para estudar os signos, Peirce nos legou a Semiótica, ciência das “condições gerais” dos
signos, uma abordagem lógico-filosófica da linguagem que tem o signo como unidade
mínima de representação.
Como referência para se pensar os níveis de percepção do mundo, a Semiótica propõe
as categorias – primeiridade, secundidade e terceiridade – de onde decorrem os tipos de
signos – ícones, índices e símbolos.
Em termos peirceanos:
A semiótica ocupa-se da semiose, que é uma ação ou influência que é ou co-envolve
uma cooperação de três sujeitos, como por exemplo um signo, seu objeto e seu
interpretante, não podendo tal influência tri-relativa, em caso algum, resolver-se numa
influência entre pares” (CP 5.4841).
Neste sentido, os processos de semiose desvelam o modo pelo qual o homem interpreta
o mundo, uma vez que o ato de interpretar está ligado a como o sujeito apreende um
objeto, seja ele concreto ou abstrato. A semiose é capaz de indicar como experiências
são vivenciadas, haja vista que o indivíduo está exposto à interação com um mundo de
sensações – temperatura, sons, cheiros, texturas, formas, cores. Tudo nos “entra” pelos
sentidos como a visão, o olfato, o paladar, a audição, o tato, os quais recebem estímulos
que, posteriormente serão transformados, através do raciocínio, em representações, que
por sua vez, formam no intérprete uma idealização mental dos objetos. Isto não se
distancia do que ocorre no culto aos orixás, nos terreiros de candomblé.
Quando o adepto do candomblé representa um objeto por meio de um pensamento de
modo tão forte que essa construção toma o “lugar” do objeto em si, um fenômeno
ocorre: a semiose.
3. Categorias semióticas para o estudo dos deuses iorubás: por uma semiose dos
orixás
Ao romper com a dicotomia significante/significado proposta por Ferdinand de
Saussure, Peirce propõe tríades que formam a semiose: (i) da relação do signo consigo
mesmo, ou seja, do representamen, depreende-se a primeira tríade, na qual, o signo
pode ser mera qualidade – qualissigno –, um existente concreto – sinsigno -, ou uma lei
geral – legissigno; (ii) da relação do signo (representamen) com seu objeto,
encontramos a segunda tríade, ícone, índice ou símbolo; (iii) da relação do
representamen com seu interpretante, a Semiótica apresenta sua terceira categorização:
o rema, o dicente e o argumento.
Neste artigo, por questões de espaço, trabalharemos com a segunda tríade, ícone, índice
ou símbolo.
1 Ao referenciarmos o texto de Peirce, Collected Papers of Charles Sanders Peirce, utilizaremos a
convenção, segundo a qual, o primeiro algarismo da esquerda indica o volume e os demais o parágrafo.
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O ícone é o signo que desponta em nós a capacidade de percebermos semelhanças,
como ocorre em diagramas, imagens, metáforas. São ícones, os signos que indicam uma
qualidade ou propriedade de um objeto ser possuidor de determinados traços de seu
objeto, os quadros, desenhos, estruturas, figuras lógicas. Como exemplos, os textos dos
rituais com suas rezas e provérbios, altamente metafóricos; a expressão “Exu é um
multiplicado ao infinito” (SANTOS, 1986, p.133); Exu enquanto imagem, expressão,
metáfora do poder dos orixás. Uma imagem qualquer, fotográfica ou mental, como a de
Oxum se banhando lentamente nas águas doces, que se reproduz em uma mente cada
vez que ouve cantigas ao ritmo do Ijexá; o desenho de Oxalá com seu cetro em uma
parede de uma casa de axé; só se tornam possíveis porque, enquanto seres humanos,
estamos munidos de uma capacidade designada icônica. É ícone, o ogó que Exu sempre
traz consigo, pois, assemelha-se a um falo. Por outro lado, é índice da alta magia da qual
Exu é o dono (VERGER, 2002, p.76). É a estrutura icônica que transpõe o texto à
consciência do leitor/adepto do candomblé. O iconismo, capacidade de reproduzir
imagens em nossa mente é um elemento da primeiridade, que segundo Peirce, assim se
traduz:
(i) Primeiridade é o modo de ser daquilo que é tal como é, positivamente e sem
referência a qualquer outra coisa (CP 8.328); (ii) perfeitamente simples e sem partes
(CP 1.531); (iii) as típicas idéias de Primeiridade são qualidades de feeling ou mera
aparência (CP 8.329).
Ao índice pertencem as relações de contigüidade, causal, real, direta, de encadeamento
entre o representamen e o objeto. Como exemplos, a aláfia, queda aberta do jogo de obi,
fruto de árvore do mesmo nome, utilizado para consultas rápidas que surgem de
perguntas cujas respostas são contempladas com um sim ou um não. Como exemplo,
utiliza-se o jogo de obi para perguntar ao orixá se aceitou a oferenda que lhe foi
destinada (PRANDI, 1996:93); uma chuva rápida logo após uma oferenda para os
orixás das águas – Oxum, Iemanjá, Obá –, indicando sua presença e receptividade; uma
pessoa com barriga d´água, associada à ira de Oxum (SÀLÁMÌ, 1991, p.13); os nomes
das energias – com seus epítetos, que lhes conferem suas “qualidades” –, não são
termos abstratos, escolhidos ao acaso e sim palavras carregadas de significado, são
índice da força do Orixá. Vale conferir alguns nomes de Exu: Elegbara, Senhor Todo
Poderoso; Alaketu, Senhor da Cidade de Ketu; Elérú, Senhor do Carrego Ritual; Ojisé,
Aquele que Tem Livre Trânsito; Enugbarijó, O Boca Coletiva; Oná, O Senhor do Fogo;
Agbá, O Representante de Todos. O mesmo fator indicial ocorre com o oriki – palavra
composta por ori + ki, a qual significa saudar ou louvar (ki) o ori ou a origem do
nomeado (Ribeiro, 1996:102) –, nome que permite às pessoas do santo ser identificadas.
Esses nomes indicam “feitos e características do indivíduo, da família, da cidade ou do
orixá a quem se refere, exercendo função documental”. Ribeiro (1996 p.130) destaca o
nome Jakuta, “aquele que briga com pedras”, para se referir a Xangô; Olokun –
Ol´=senhor / okun = mar –, Senhor do mar, dentre outros, como títulos que indicam as
qualidades da energia. No culto aos orixás, quando se é iniciado, o corpo recebe cortes
que são chamados de “curas”; temos aí, um índice, sinal indicativo de iniciação. O
mesmo ocorre entre os iorubás que marcam seus rostos com cortes que apontam sua
posição social. É índice o modo de se vestir: quando uma ialoríxá está usando seus
diversos colares, e dentre eles podemos ver o laguidibá, colar de âmbar, que marca sua
posição na hierarquia; de mesmo modo, seu torso também será sinal de poder se
apresentar duas abas o mais “majestosamente” levantadas, firmes. Os números pares no
culto aos orixás, são índices de equilíbrio, harmonia, felicidade, pureza, por isso, são
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duas as vezes que “os búzios são lançados para encontrar o odù, ou o signo, que (...)
governará a vida do iniciado (VERGER, 2002, p.41); em contraste com os números
ímpares que indicam desequilíbrio, passagem, desordem impureza, perigo (SERRA,
2006, p.296). Em especial, o número três indica a presença de Exu, e por meio dele
ritual e mito se encontram: são três “as saídas sucessivas da camarinha”; são três as
vezes que a zeladora leva um ebó ao chão antes de depositá-lo; são três as porções de
água que se joga sobre a terra para umedecê-la e louvar os orixás; bem como são três as
vezes em que determinadas folhas são mostradas ao carneiro quando se prepara dado
ebó; são três as voltas que os filhos de santo dão na praça, com sua zeladora, após a
iniciação; são três as vezes em que o iniciando senta e levanta do pilão antes da
raspagem (VERGER, 2002, p.39-46) – o três aí indicada a necessidade primeva de
louvar Exu e todas as energias do culto. Já o número sete é índice dos orixás masculinos
e o número nove, dos orixás femininos. São índices os textos sagrados – o oríkì
(saudação), àdúrà (reza), orin (cantiga) – “cuja força e profundo significado revelam
feitos e características dos orixás” (SÀLÁMÌ, 1991, p.13). Outros índices, que saltam
em qualquer cerimônia pública são as ações do orixá encarnado em seu filho. Ele indica
a “idade de santo”, o tempo de iniciação quando o orixá brada seu ilá e posiciona para
trás suas mãos, indicando que o iniciado tem sete anos ou mais nos cultos, ou quando
permanece com as mãos na “quartinha”, posicionamento em que as mãos do orixá ficam
uma sobre a outra, na altura da cintura, ao lado esquerdo do corpo, e não solta seu ilá.
De mesmo modo, “o acesso a determinados ritos está em relação direta com o grau de
iniciação” (SANTOS, 1986, p.21). É índice, nos terreiros no Brasil ou na África
(LÜHNING, 1999, p.127), o uso que se faz do mariwo, folha de palmeira, símbolo de
Ogum (VERGER, 2002, p.87), colocada sobre os batentes das portas, sobre as
passagens, “desfiadas formam uma barricada que protege o lugar contra as más
influências, ao mesmo tempo em que proíbem a passagem dos profanos para dentro do
templo.” Com o símbolo, temos a secundidade, que em termos peirceanos, assim se nos
apresenta:
(i) Secundidade é o modo de ser daquilo que é tal como é, com respeito a um segundo,
mas sem observar qualquer terceiro (CP 8.328); (ii) o tipo de idéia de Secundidade é a
idéia de esforço, prescindido da idéia de um propósito (CP 8.330).
O símbolo nasce da relação arbitrária entre o signo e o objeto. É independente de
semelhança e das relações causais, pauta-se pelas convenções criadas: palavras, regras,
leis, significados em geral. O símbolo se relaciona com seu objeto por força de uma
idéia na mente do usuário; não está ligado “àquilo que significa através de alguma
similaridade (caso do ícone), nem por conexão causal, fatual, física, concreta (caso do
índice)”. A relação entre o símbolo e seu objeto se dá por meio de um hábito ou lei, que
dá ao símbolo condições de representar algo diferente dele (SANTAELLA, 2001, p.63).
O oxé, machado duplo de Xangô, enquanto símbolo de força e de alta magia; os búzios
e as diversas conchas utilizadas nos rituais como símbolo de riqueza; o dendê símbolo
do “sangue vegetal vermelho”; a água como símbolo de fertilidade; o chifre de búfalo
que adorna o assentamento de Iansã como símbolo de força deste orixá; as máscaras que
nos apresentam as ancestrais femininas, as grandes “mães feiticeiras” (VERGER, 1992);
o assentamento de Exu com seus tridentes; não tem qualquer relação causal com aquilo
a que se referem, mas são aceitos como símbolo pelo grupo no egbé.
O mesmo ocorre com o pilão, símbolo do poder de Xangô; o bàtá, tambor tocado com
duas varinhas no culto aos orixás e consagrado a Xangô; a cabaça como símbolo do
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destino, controlado por Ifá; o màriwò, folha da palmeira, símbolo de Ogum; o ofá, arco
e flecha, símbolos de Oxossi.
Juana Elbein dos Santos (1986, p.17) adverte, porém, quanto à interpretação simplista
dos símbolos, uma vez que “o significado de um elemento está em função de suas
relações com outros elementos. O significado de um elemento é uma função e não uma
qualidade.”
Analisando a simbologia presente nos mitos que se referem às lutas entre Ogum e Oyá,
temos a reiteração da força, às vezes brutal, manifestada para defender os interesses
destas energias, numa visão bastante humanizante; em contrapartida, os mitos que
envolvem Oduduá e Obatalá, parecem sempre simbolizar um macrocosmo
transcendental que deificam estes orixás “distanciando-os” dos interesses humanos
(SERRA, 2006, p.298).
Enquanto convenção, o aspecto simbólico dos rituais se faz presente de inúmeras
maneiras, desde os gestos na dança, os movimentos do corpo, o ritmo dos passos
(BARBARA, 2002); até a comparação entre as formas de se cultuar divindades na
África, no Brasil e em Cuba: há orixás que continuam sendo adorados na África, e o
mesmo pode não acontecer no Brasil; “na Bahia todos os orixás são chamados à terra,
enquanto que na África são saudados por alguns ritmos de tambor, e por se tratar de
uma cerimônia somente para Xangô, apenas o deus do raio será chamado” (LÜHNING,
1999, p.112).
O símbolo é, portanto, uma convenção, um constructo social e mutável que vai se
instalar nos rituais e nos mitos, no comportamento sagrado e, por meio de cerimônias
como a recitação de um mito, a consulta aos orixás, a decoração do barracão para uma
festa, uma limpeza de um filho-de-santo, serve para induzir e motivar “os símbolos
sagrados nos homens e as concepções gerais da ordem da existência” (GEERTZ, 1989,
p.82). Estes símbolos, enquanto um conjunto de “sistemas entrelaçados de signos
interpretáveis” (GEERTZ, 1989, p.10), formam e são formados pela cultura de dado
grupo, e como tal, ficam expostos às múltiplas interpretações a depender dos contextos
(SILVEIRA, 2004, p.27).
A antropóloga, Juana Elbein dos Santos (1986, p.24) afirma que “o símbolo é uma
realidade que transcende”. Os elementos que compõem os rituais – búzio, palha, conta,
ritmo – transcendem o tempo e o espaço e se fazem símbolos porque “são selecionados
e aceitos pelo consenso do grupo para representar uma necessidade, uma carência”, e ao
ser veiculado de geração em geração “se constitui em signo de comunicação, em uma
referência que singulariza”. São os símbolos que “têm a capacidade de levar os iniciados
ao cerne da cosmogonia do candomblé” (SALLES, FALCÃO: 2003).
Destaco por exemplo a representação dos orixás em seus assentamentos. Serra chama
atenção para Ossain, o orixá das folhas. Seu símbolo sagrado é uma representação
cosmográfica:
geralmente consiste numa escultura (em ferro) que, em sua forma canônica, ortodoxa,
compreende uma haste plantada no centro de uma barra redonda, cercada por outras, em
número de seis (ou oito), divergentes a partir do mesmo tronco pouco depois de sua
implantação; a haste central é encimada por um pássaro. A peça sugere uma planta, o
pássaro representa o poder, o axé, de que Ossâin é considerado em diversos mitos, o
grande portador e o grande distribuidor. (SERRA, 2006, p.301)
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Os símbolos a que Serra alude estão ligados ao alto poder do orixá Ossain. A haste com
suas outras seis hastes são símbolos de veiculação de energia, de harmonia, de controle,
mediação, e transmutação de axé. O pássaro, longe de ser uma ave em seu sentido
literal, uma simples ave, está comprometido com “os pássaros”, de quem as “mães
feiticeiras”, as àjé, se apropriam e se personificam. Estas feiticeiras representam “os
poderes místicos da mulher em seus aspectos mais perigosos e destrutivos”. (VERGER,
1992, p.24; 2002, p.122); neste aspecto, podemos propor a ferramenta de Ossain como
símbolo de seu envolvimento com a alta magia. Verger (2002, p.123) dá conta de uma
lenda na qual o pássaro é a representação do poder de Ossain. Como seu mensageiro vai
a todos os lugares e retorna para lhe contar o que está acontecendo. Neste sentido,
enquanto espaço simbólico, os pássaros são representantes de alto poder mágico,
veiculado pelas “mães feiticeiras” e por Ossain. Quanto ao fato de sua ferramenta
sugerir – assim Serra coloca – uma planta, não há dúvida, temos um índice.
Enfim, poderíamos dizer que no culto aos orixás tudo é símbolo, desde que o lugar do
contexto “dinâmico” seja verificado.
Caso a se destacar é o das penas ekodidé, que “pertencem ao vermelho, representam o
poder e o axé de Osun-Olori-Eleye” (SANTOS, 1986, p.89). Amarradas à cabeça do
filho de santo podem significar uma série de coisas. O que fazer então? Entendê-las
como índice de poder, de axé, uma vez que não guarda qualquer semelhança com o axé
em estado latente, poder espiritual, ou destacá-las como um símbolo, uma vez que são
uma convenção de um dado grupo?
Santos (1986, p.89) aprofunda a questão ao propor que os ekodidé “não simbolizam o
vermelho genérico, mas – como os cauris, os búzios, para o branco – representam
fragmentos do vermelho, seres individualizados, o elemento procriado.” Pretendo
afirmar, então, que tanto os ekodidé, quanto os cauris são neste aspecto símbolos, já que
no culto nada têm “um significado constantemente intrínseco, mas essencialmente como
fazendo parte de uma trama e de um processo” (SANTOS, 1986, p.17).
Para que não paire dúvidas, quero ratificar minha afirmativa do parágrafo anterior: “no
culto aos orixás tudo é símbolo”; principalmente quando entendemos que os rituais e
tudo que ali está disposto –, inclusive os discursos –, são permeados pelo poder do axé;
foram fundamentados no axé, por isso, o reiteram, ratificam, corroboram, reelaboram o
axé, num movimento cíclico, contínuo, de capacidade simbólica infinita. Essa também é
a visão da antropóloga:
Todos os objetos rituais contidos no “terreiro, dos que constituem os “assentos” até os
que são utilizados de uma maneira qualquer no decorrer da atividade ritual, devem ser
consagrados, isto é, ser portadores de axé. Os objetos têm uma finalidade e função.
Expressam categorias, diferentes qualidades. Seus elementos são escolhidos de tal
forma que constituam um emblema, um símbolo. (SANTOS, 1986, p.37).
A dijina, nome que será dado ao iniciado, por exemplo, tem de ser descoberto e não
“inventado”, porque através dele, se veiculará axé, poder vital, toda vez que seu nome
for pronunciado, num mecanismo que saúda as energias que o protegem (RIBEIRO,
1996, p.119).
Verger (LÜHNING, 2002, p.48) retratando uma iniciação de Xangô conta que depois de
encarnado, esse orixá “é conduzido ao interior da casa, onde se reveste dos hábitos
litúrgicos da divindade (...).” Ao que após, retorna, utilizando-se do oxé, “o duplo
machado simbólico do deus, para benzer a multidão ajoelhada, os tambores que dizem
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sua glória”. Também encontramos em Verger o banho no rio como processo simbólico
para “se despir de sua antiga personalidade”. Uma outra passagem ilustra esta
característica do culto: Verger relata o fato de Roger Bastide ter recebido na Bahia “um
colar de pérolas de vidro vermelhas e brancas alternadas, cores simbólicas de seu deus”,
o que por ele era considerado um “passaporte” que facilitava sua ligação com
cultuadores de orixás na África e o identificava como “filho de Xangô” (LÜHNING,
2002, p.47).
Os elementos simbólicos “criam” e se “envolvem” em uma metafísica transcendental,
de modo que, o iniciado não se inclina diante da madeira, porcelana, barro, palha ou
pedras, mas diante do abstrato-sagrado, veiculando a essência mística que simbolizam.
Neste sentido, o ogó e a cabaça de Exu – que citei acima como sendo ícones porque
guardam semelhança com o órgão sexual masculino –, tornam-se símbolos de alta
magia: o ogó, espécie de cetro mágico, pode transportar Exu para os caminhos mais
longínquos, e sua cabaça lhe confere ligação à ancestralidade feminina e masculina e a
criação do mundo. Exu está ligado a estes símbolos por ser o portador mítico do sêmem
e do útero ancestral (SANTOS, 1986, p.130). Aliás, não só Exu simboliza um poder
fálico. Serra (2006, p. 297) dá conta de que Ogum, deus agressivo e criador, em
diversos mitos e rituais aparece ligado à questão da criação. Neste sentido, à Ogum
também são conferidas características fálicas: seu facão e a vara de ferro com a qual
manipula magias estão sempre presentes, além de ser o número sete, o que mais está
associado a este orixá, o “que tem grande importância cosmológica no sistema”.
Os símbolos são estratégias para englobar situações e sua interpretação, “uma vez
descoberto seu nexo ontogenético, seu ou seus referentes, permite-nos tornar explícita a
realidade fatual” (SANTOS, 1986, p. 23). Por isso, posso afirmar que os mitos são
símbolos que transcendem o dito comum “lendas populares”, são mitos africanos que
apreendem em seu contexto símbolos universalmente reconhecíveis com significação
psicológica e espiritual (FORD, 1999).
4. Pensando em concluir: o “culto” semiósico
Assim, o jogo semiósico vai se estabelecendo entre o sujeito e o mundo, sujeito e
deuses, deuses e mundo, por meio da mediação sígnica.
É possível dizer que no candomblé, são os mitos que enquanto interpretantes – efeito
interpretativo que o signo produz –, referendam os rituais.
O mundo construído pelos ritos e seus mitos se dá, portanto, em termos semióticos,
através da apreensão dos objetos por meio das categorias que participam da semiose.
Em outras palavras, o sentido não é uma criação de um eu transcendental, mas uma
construção, resultado do encontro e da relação de um signo com outro signo, o que se dá
continuamente, infinitamente, mesmo sem que nos apercebamos disso.
No tocante ao culto aos orixás, o homem – também sendo ele um signo – está diante de
estruturas que se expressam por símbolos – “toda a religião, sua morfologia, sua prática,
todos os seus conteúdos (...)”. Por isso, “desvendar as correspondências dos símbolos e
os interpretar nos permite explicitar os conteúdos do acontecer ritual” (SANTOS, 1986,
p.25). O homem, sem dúvida, cria os signos que compõem os mitos e os rituais com
seus símbolos significantes, mas também é controlado e criado por eles, numa contínua
retroalimentação da semiose.
Os conceitos semióticos, com suas categorias, apresentam como interpretamos, como
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pensamos as coisas, de que modo os fenômenos são apreendidos pelos sujeitos. O
conhecer, o apreender, o representar o mundo – dos rituais –, ocorre, portanto, nessa
interação que parte da assimilação dos objetos, da sua categorização, e de sua seqüente
representação, transformando-os em signos novamente. Esse processo não é outro senão
a semiose.
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